Lançamento agosto 24, 2025
O zumbido incessante do trem, avançando veloz por seu túnel subterrâneo, entorpecia meus sentidos e isolava o mundo exterior. Na escuridão do túnel, havia apenas a luz constante, embora fraca, do artefato de iluminação de nossa cabine e o ocasional clarão de uma plataforma de serviço iluminada através da janela do vagão. Tessia dormia ao meu lado, tendo adormecido com a cabeça no meu ombro.
Seis meses…
Pareceram uma eternidade e um piscar de olhos ao mesmo tempo. As coisas progrediram tão rápido. Novos governos. Novas tecnologias. Um paradigma inteiramente novo para a maioria das pessoas.
A aparição de Epheotus no céu e a Espiral das Relictombs no horizonte não foram recebidas com alegria por todos, e os novos corpos governantes do mundo estavam com as mãos cheias apenas para manter a paz e encorajar todos a permanecerem esperançosos.
Não tinha certeza se ajudava o fato de os asuras terem permanecido largamente fora de vista até agora. Para a maioria das pessoas, eram uma fonte de medo, embora houvesse uma facção barulhenta em Dicathen que clamasse para que eles nos guiassem como reis-deuses em vez de depender de líderes “menores”. Ironicamente, minhas cartas de Seris e Caera — a presidente da Assembleia Alacryana, Caera Denoir, quero dizer — indicavam que os alacryanos resistiam muito mais à ideia de uma nova liderança asurana do que os dicathianos. Suponho que faça sentido. Eles viveram sob Agrona.
Meu olhar deslizou do rosto sereno de Tessia, adormecida, até seu ventre, onde suas mãos repousavam. Nesta postura relaxada, e sabendo onde procurar, conseguia vislumbrar o ligeiro arredondamento da sua barriga. Com cuidado, para não acordá-la, pressionei minha mão em sua barriga. Era cedo demais para sentir algo tão evidente como um movimento, mas conseguia sentir as minúsculas centelhas de vida dentro dela, distintas da sua própria. Duas delas.
Retirei a mão e deixei minha cabeça repousar no encosto acolchoado, fechando os olhos, um sorriso persistente nos lábios. Minha atenção voltou-se para dentro, em um ato de meditação tão familiar como o som da minha própria voz. Extrair força de dentro de mim era clarificante, tanto mental como fisicamente. Eu sentia o mesmo calor reconfortante que Ellie descrevia quando Boo a fortalecia por meio de seu vínculo.
Com os sentidos aguçados, o ruído e a vibração do trem se intensificaram, mas meu foco apurado cortava o barulho, permitindo-me captar detalhes que, de outra forma, passariam despercebidos. Pela janela, as paredes escuras do túnel pareciam deslizar lentamente, e eu conseguia sentir as centelhas de vida de minha família em suas próprias cabines, espalhadas pelo trem.
Fui além, e comecei a emitir um leve brilho.
— Hm — murmurou Tessia, virando ligeiramente a cabeça enquanto a luz sutil dançava sobre minha pele. Sem abrir os olhos, ela acrescentou: — Durma um pouco, Arthur.
— Desculpa — respondi suavemente, beijando o topo de sua cabeça. — Estou muito animado para dormir. Afinal, vamos nos casar em três dias.
— Já nos casamos, ou você esqueceu? — perguntou ela, sem abrir os olhos.
— Espera, casamos? — Levei um dedo aos lábios, fingindo reflexão. — Uma cerimônia discreta no quintal? Você, radiante de branco? Um peixe dourado gigante saltando do lago ao fundo? Desculpe, não me recordo.
Um sorriso pairou em seu rosto como luz sobre a água, brilhante e cintilante.
— Você é tão brega (cheesy).
Toquei seu flanco, fazendo-a estremecer.
— Você adora queijo (cheese) — provoquei.
— Rey e Rin é que adoram queijo — respondeu ela. Abrindo os olhos, endireitou-se no assento e colocou uma mão sobre a barriga.
Suas palavras me atingiram como um golpe inesperado no estômago, e tive que me lembrar de respirar. Reynolds e Rinia Leywin. Eu ia ser pai.
Engoli em seco, sem fôlego diante da súbita onda de emoção.
Uma única linha fina apareceu entre as sobrancelhas de Tess.
— Você comeu algo desde que embarcamos? Seu corpo não sobrevive mais sem comida e sono.
Esfreguei a nuca, forçado a reconhecer, pelo menos para mim mesmo, que estava de fato cansado e com um pouco de fome.
— Vou pegar alguma coisa. Só queria fazer algumas rotações. Além disso, alguém estava dormindo no meu ombro.
Foi a vez dela me cutucar no flanco.
— Não comece a me culpar por isso — brincou ela. — Como se eu não estivesse mandando Hela emboscar você com lanches a toda hora, só para garantir que você se alimente. Há um vagão inteiro neste trem dedicado à comida, então é melhor aproveitar.
Ergui as mãos em rendição.
— Você está certa, claro. Estou tentando melhorar. Cuidar de mim mesmo.
Ela mordeu o lábio, depois se moveu para recostar a cabeça no meu ombro novamente.
— Algum progresso?
Hesitei antes de responder. Nós dois tínhamos estado tão ocupados que não tinha mantido Tessia totalmente a par de tudo o que tinha feito. Como líder de fato da nação élfica dizimada, ela lidava com a maior parte das negociações políticas de Elenoir em nosso novo e mais complexo mundo. Embora a pequena população élfica ainda não tivesse concordado oficialmente com qualquer tipo de corpo governante, seus olhos voltaram-se coletivamente para Virion e Tessia como os dois únicos Eralith restantes. E Tessia tinha atendido a esse chamado, fazendo tudo ao seu alcance para garantir que, após a recuperação da terra, todos os elfos sobreviventes teriam um lar em Elenoir.
Ela gostava de brincar que ajudava estar casada com o homem que salvou o mundo, que lhe dava muito capital político para gastar.
— É… difícil dizer — admiti após um momento, tentando lembrar quando havíamos discutido meus avanços pela última vez. — Os últimos fragmentos da vontade de Myre desapareceram, mas não notei quaisquer efeitos negativos no meu corpo.
Mana pulsou pelo vagão do trem.
— Parece que o éter está bem denso ao nosso redor, mas você não parece ter muito circulando em seu corpo, não. Um pouco de mana, como todos — observou Tessia. Embora ainda fosse uma maga de núcleo branco — seu treino com Varay tinha corrido bem, mas ainda não a levou a um avanço na Integração —, o conhecimento e os sentidos de Tessia beneficiavam-se do tempo em que esteve conectada a Cecilia.
Permaneci em silêncio, pensativo, meus olhos vagando pela pequena cabine. O trem tinha um design confortável, muito diferente de algo que Gideon ou Wren teriam inventado. Madeira polida e rica compunha as paredes, enquanto couro verde suave adornava os assentos, estofados e tratados para serem duradouros e resistentes ao fogo.
Pareço o Gideon fazendo seu discurso de vendas, pensei com divertimento.
— Arthur?
A voz de Tessia me trouxe de volta à conversa.
— Certo. Desculpe. Estava admirando o acabamento deste trem. Sem o Gambito do Rei, esses lapsos de foco haviam se tornado mais frequentes. Um efeito colateral de dependido tanto da runa divina, que esperava que diminuísse com o tempo. — Estou bem, sério. Me sinto… bem. Ótimo, até.
— Fico feliz. — Seus dedos entrelaçaram-se aos meus. — Se essa força vital canalizada, esse ki, te dá o poder de ficar comigo por muito, muito tempo, Arthur, então apoio tudo o que você precisar fazer, e te ajudarei como puder.
— Hm… — Fitei seus olhos azul-esverdeados. — Já te disse que te amo?
Seus lábios se curvaram num canto, enquanto ela tentava conter um sorriso.
— Em algumas ocasiões.
Houve uma mudança sutil na sensação do movimento do trem ao subir uma ligeira inclinação, e então a escuridão do túnel desapareceu, e nossa cabine foi banhada pela luz natural da manhã. O sol ainda estava oculto pelas Grandes Montanhas, diretamente a leste. Naquele ângulo, a Espiral das Relictombs era visível na borda da janela, erguendo-se das montanhas ao sudeste.
— Parece que estamos quase chegando — disse Tessia, a voz tingida de tensão. — Será a última vez que poderemos apenas… estar juntos por um tempo.
Assenti, roçando distraidamente as costas dos dedos em seu braço.
— Não sei por que concordei em ficar em Xyrus e ajudar Vanesy a incorporar trabalho com éter ao novo currículo da escola.
Ela bufou indelicadamente.
— Você sabe o porquê.
Olhei para minha esposa com divertimento.
— Sei que é apenas uma cerimônia pública, não nosso casamento de verdade, mas nunca tivemos uma lua de mel. Eu deveria ir com você para Elenoir. Ainda há tempo para o resto. Minhas promessas ao Destino… Não tenho certeza se faz sentido começar a me preocupar com o éter tão cedo. Precisamos de mais tempo para pesquisar e entender as novas Relictombs. Ainda posso desistir…
Ela balançou a cabeça, ficando mais séria.
— Será apenas um ou dois meses. — Meus olhos desceram automaticamente para sua barriga, e sua expressão suavizou. — Vou ficar bem, e você terminará muito antes de esses dois chegarem.
Meu peito apertou com ansiedade.
— Então cancelarei minha viagem a Epheotus depois. Os outros lordes podem ter uma reunião sem mim…
— Arthur Leywin.
Fechei e abri meus punhos, reprimindo a apreensão.
Tessia segurou meu rosto com as mãos e me puxou para um beijo. Afundei-me nela enquanto ela extraía minha ansiedade crescente como veneno de uma ferida. Quando me soltou, deixei-me deslizar de volta ao assento macio e suspirei.
— Os asuras estão ainda mais perdidos do que nós aqui embaixo — disse ela, repetindo minhas próprias palavras. — Sabemos que eles não podem ter uma reunião sem você. Você mesmo disse: eles estão sendo forçados a avançar em um ritmo perigoso, aos olhos deles. Isso também abre nosso mundo ao perigo.
— Eu sei. — Fechei um bico para ela, depois virei-me para olhar novamente pela janela. Estávamos muito longe para ver a base da Espiral, que engoliu os escombros da Muralha e quilômetros de encosta montanhosa ao redor, mas estávamos perto o suficiente para apreciar sua imensidão. A Espiral das Relictombs fazia as imponentes Grandes Montanhas parecerem tudo menos grandes. — Mas… eu já salvei o mundo, não salvei?
Ela riu, um tilintar leve que fez meu estômago vibrar, mesmo depois de tanto tempo.
— Vamos apressar tudo isso para que possamos nos concentrar em Reynolds e Rinia quando eles chegarem, tudo bem?
Acomodamo-nos nos braços um do outro e fechamos os olhos, nossas respirações sincronizando-se. O momento, contudo, não durou muito, pois as portas do nosso vagão abriram-se de repente com um estalo que soava caro, as cortinas das janelas enrolando-se imediatamente.
— Ops — disse Chul, enquanto se esgueirava pela abertura, que mal acomodava seu corpo robusto. Ele se jogou no assento à nossa frente, os braços abertos ao longo do encosto, e cruzou uma perna sobre a outra. Seus olhos desiguais brilharam com a luz solar indireta. — Meu irmão, ainda não entendo por que estamos viajando neste verme escavador em vez de voar. A jornada para a Cidade de Xyrus teria sido muito mais curta.
— Chul, é geralmente educado bater antes de entrar por uma porta fechada — lembrou Tessia gentilmente ao meio-fênix corpulento.
— Ops — repetiu ele. — Há tanto a aprender sobre sua cultura. Dedicarei-me a dominar suas muitas, muitas, muitas regras estranhas.
— Como isso é uma… sabe, deixa pra lá. — Tessia lançou-me um sorriso secretamente. — De qualquer forma, agradecemos por viajar conosco. O Gideon ficou muito animado em organizar esse trem especificamente para chegarmos a Xyrus.
A Academia de Xyrus ainda não estava aberta, e Vanesy concordara em sediar nossa segunda cerimônia de casamento — pública — lá. Não achava necessário compartilhar o evento com o mundo, mas Tessia acabou me convencendo — após ser pressionada de várias direções — que uma exibição pública de nossa união seria um farol de esperança para um continente temeroso.
Ellie apareceu na porta, bocejou e afundou-se no assento ao lado de Chul, cutucando-o com um pé para ele se afastar, o que ele fez.
— Lua e estrelas, ainda estou dolorida. Pelo menos quando você treinava com Kordri, estava naquele… como chama mesmo? O “reino da alma” ou algo assim? Queria não estar usando meu corpo real.
— Você está certa. Eu só tinha que morrer repetidamente — retruquei. — Lembra como é isso?
Ela empalideceu.
— Sim. Esquece, acho. — Sua cabeça virou-se para Chul. — Esqueci de perguntar ontem. Naesia vai se juntar a nós na cerimônia?
Chul assentiu, um sorriso largo espalhando-se por suas feições robustas.
— Ela fará parte da delegação asura presente.
— Só lembre-se, é deselegante ficar noivo no casamento de outra pessoa — provocou Ellie.
Ele grunhiu, repousando as mãos atrás da cabeça.
— Essas coisas não acontecem tão rápido para meu povo. Um cortejo pode durar décadas, até séculos.
Ellie soltou uma risada.
— Sério? Porque, não faz muito tempo, todas aquelas princesas asuras estavam rondando meu irmão como falcões famintos.
— Espera, como é que é? — Tessia endireitou-se, as sobrancelhas erguidas dramaticamente. — Princesas perseguindo Arthur?
Revirei os olhos, puxando-a de volta para meu lado, já tendo ouvido essa provocação uma dúzia de vezes ou mais.
Chul apenas deu de ombros para Ellie e Tessia.
— Às vezes, é preciso esperar pacientemente pela presa, outras vezes, deve-se atacar como a Serpente de Hades para garantir a caça.
Ellie riu, balançando a cabeça.
— Presa, é?
— E às vezes — disse Sylvie de repente, aparecendo na porta com Regis — até os seres mais antigos carecem do contexto e da experiência para verdadeira sabedoria ou graça.
— Você não é basicamente um bebê entre sua própria espécie? — disse Regis atrás dela, com uma risadinha. — Até Chul é, o quê, cinco vezes mais velho que você?
Sylvie deu-lhe uma cotovelada no quadril, com um sorriso maroto.
— A idade não é algo simples de calcular para nós, é?
Tessia bateu no assento ao lado dela, indicando a Sylvie para sentar conosco.
— É exatamente por isso que é tão essencial mantermos um intercâmbio constante de ideias e valores culturais. Tão importante quanto ter Arthur nos representando como arquonte entre os grandes lordes, segundo Mordain, a responsabilidade de construir relações com os asuras de Epheotus recai sobre nós.
Sylvie sentou-se e pegou a mão de Tess com ambas as suas, apertando suavemente.
— Eles são lentos para mudar. Muito do que meu avô fez foi garantir que não mudassem, na verdade.
— É verdade — disse Chul, sua voz vibrando pelo vagão. — Até que os asuras aprendam a ver vocês como mais do que “menores”, será imprudente dar-lhes muita autoridade sobre vocês. O respeito deles pela posição de Arthur entre eles só sustentará uma aliança até certo ponto.
A conversa tomou um rumo familiar, e senti meu foco escapar, meu olhar voltando-se para a janela. O trem corria ao pé das Grandes Montanhas, que pareciam arrastar-se lentamente apesar de nossa velocidade. O trem corria ao pé das Grandes Montanhas, que pareciam arrastar-se lentamente apesar de nossa velocidade. A maioria se virou para olhar maravilhada enquanto o trem passava correndo.
Pelo que entendi da linha férrea, nossa emersão significava que estávamos quase na estação Xyrus. E à nossa espera estariam o burburinho dos preparativos, pedidos insistentes — e mal educados — demais para reuniões e apertos de mão, a necessidade suplicante de garantias constantes de todas as direções, as reconsiderações, as acusações…
Dentro de uma hora, estaria desejando a paz e a privacidade deste vagão novamente.
Depois disso, viria o trabalho na academia, e uma reunião dos Oito Grandes. E, claro, havia os múltiplos pedidos que recebi da Associação de Ascendentes em Alacrya para discutir mudanças estruturais agora que não havia um Alto Soberano para controlar o fluxo de relíquias. E uma pilha inteira de cartas-convite para me juntar a vários grupos de aventura diferentes aqui em Dicathen, mesmo que apenas como membro honorário. E uma audiência oficial com o novo rei dos anões, que eu vinha adiando há meses. E, aparentemente, tinham conjurado uma estátua minha sobre o Lago Espelhado, para a qual o representante de Char andou tentando me fazer ir a uma inauguração oficial.
E assim por diante, sem fim.
Eventualmente, tudo se acalmaria, eu sabia, e Tessia estava certa: cumprir essas obrigações era necessário para que pudéssemos passar tempo como família, com nossos filhos. Porém, isso não seria o fim. Na verdade, seria quando o verdadeiro trabalho começaria.
E não apenas a paternidade, pensei com um sorriso suave.
A Fonte de Chama Eterna na Espiral das Relictombs continuaria a liberar éter até que o cisto do vazio etéreo finalmente colapsasse. Seu fluxo alimentava as Relictombs, fornecendo energia para todos os projetos dos djinn, mas os Anéis de Epheotus dependiam de uma interação entre gravidade e éter atmosférico, garantindo que não colapsassem novamente em quinhentos anos.
Ainda assim, para cumprir minha promessa ao Destino — realizar a visão que mostrei a ele — exigiria mais do que apenas a saída constante da fonte. Ela aliviava a pressão, mas não resolvia o problema. Sem uma liberação adicional, a Fonte de Chama Eterna provavelmente iria erodir ou potencialmente colapsar totalmente, sinalizando outra catástrofe.
O real objetivo da Espiral não estava na saída etérea que ela proporcionava, mas no conhecimento ali armazenado. O uso generalizado do éter amplificaria significantemente a taxa na qual poderíamos esvaziar o reino etéreo. E com a ajuda dos dragões — liderados por aqueles dispostos a ensinar, como Vireah e sua mãe —, nossas chances de sucesso só aumentavam.
E com o Destino mais calmo e o reino etéreo esvaziado, sua pressão diminuída, este mundo estaria verdadeiramente salvo.
Exceto, claro, pelo que quer que Kezess temesse. O pensamento intrusivo foi como uma injeção no meu braço, e eu me endireitei, ficando rígido. Não pensava nas advertências de Kezess há semanas. Era talvez meu único arrependimento, não ter tido mais tempo com Myre no final, para tentar compreender mais plenamente. Era difícil me preocupar com os temores fantasmas de uma divindade megalomaníaca diante de todos os problemas muito presentes que exigiam minha atenção constante.
— E no entanto, um de nós permanece em silêncio sobre o assunto. Ainda não vai nos contar, meu irmão? — Chul perguntou.
Minha mente lutou para voltar ao momento atual, e percebi que minha mãe e Virion tinham se juntado a nós também. Estava tão imerso em pensamentos que nem senti suas centelhas de vida se aproximando.
Enquanto tentava entender sobre o que estavam falando, Ellie deu um soco no braço de Chul.
— Ele é meu irmão. É assim que eu o chamo!
Levantei-me, passei por Regis, que ia se arrastando para o espaço aberto entre os bancos, gesticulei para que mamãe tomasse meu assento e me postei na porta.
Ela coçou Regis atrás da orelha, então se acomodou ao lado de Tessia, sorrindo e ajeitando uma mecha solta do cabelo de minha esposa.
— Sobre o que estávamos falando?
— Estamos tentando convencer Arthur a nos contar como decidiram chamar o mundo — explicou Ellie.
Virion, sentado na borda do assento ao lado da minha irmã, lançou-me um olhar, e fiz um leve aceno de cabeça.
— Não, não vou contar — falei.
Antes, nunca foi estranho para mim que este mundo não tivesse um nome, mas desde a Confluência, subitamente tornou-se um tópico regular de conversa. Eu sabia que os djinn tinham seu próprio nome para ele em sua era, e fui forçado a me perguntar quantos nomes haviam nascido e morrido com as populações do mundo…
Minha mandíbula se apertou. Sentindo olhos sobre mim, virei-me ligeiramente; Tessia encarava a lateral da minha cabeça com preocupação. Apertei sua perna logo acima do joelho, fazendo-a pular, então murmurei:
— Estou bem.
Ela deu-me um olhar irônico.
— Pessoalmente, acho que “Artoria” seria um bom nome — disse ela. — Soa forte e muito bonito.
Ellie e Regis riram, olharam um para o outro e disseram “credo!” ao mesmo tempo, rindo ainda mais alto.
Tessia inclinou a cabeça ligeiramente para o lado.
— Sério, Eleanor? Juro que o jovem aprendiz de ferreiro de Ashber não para de arranjar desculpas para fazer entregas na propriedade…
Voltei completamente à conversa.
— Espera, como é que é?
— O quê?! — exclamou Ellie, ficando vermelha e evitando meu olhar. Ela apontou o polegar para Virion ao seu lado. — Vovô aqui pode ter uma namorada, mas eu não posso nem conversar com um garoto?
Virion piscou, então pigarreou e ergueu as mãos em um gesto de defesa.
— Não sei como fui arrastado para isso! Além disso, não é… é apenas uma companhia amigável, não colocamos um nome nisso… — Ele lançou um olhar fulminante para minha irmã, como quem diz vamos conversar sobre isso depois, mas Ellie apenas semicerrrou os olhos em desafio.
— Sabe, tive uma ideia sobre o nome há alguns dias — disse Mamãe, orgulhosa. — Se quisessem ser espertos, combinariam alguma forma dos três continentes — ou dois continentes e os anéis, ou como quer que chamem. Tipo… Dilacreotus.
A cabine ficou em silêncio por um momento, então explodiu em risadas. Chul bateu no joelho, Ellie escondeu o rosto nas mãos, Tessia mordeu o lábio, mas tentou assentir encorajadoramente, e Virion disse:
— Bem, é uma ideia.
— Não dê ouvidos a esse bando de sapos coaxantes, querida. Acho que tem potencial. — Regis piscou para minha mãe, e resisti ao impulso de chutá-lo. — Pessoalmente, no entanto, acho que seriam loucos se não escolhessem minha sugestão.
— Que é? — perguntou minha mãe, meio divertida, meio apreensiva.
— Regis-lândia! — exclamou ele, orgulhoso.
Chul concretizou meu impulso, dando um chute brincalhão em seu traseiro.
Segurei minha língua, deixando que eles se divertissem.
No tempo decorrido desde a Confluência, finalmente tive tempo de rever as memórias registradas por Haneul no cristal de memória que revelou a infalibilidade do Destino. O único cristal de memória continha um tesouro de informações sobre as Relictombs e os djinn.
Eles eram um povo em constante evolução, e sua visão de mundo não era diferente. Para eles, os nomes tinham poder e podiam evoluir juntamente com a compreensão de uma coisa — como o Requiem de Aroa — e por isso tiveram muitos nomes para o mundo ao longo de sua civilização.
E nomes para o que seu mundo ainda não era, mas ao qual aspiravam. Traduzido, seu mundo idealizado significava algo como ser coroado em paz.
Ji-ae me ajudou a entender e, de certa forma, deu a bênção do povo djinn para seu uso. Os grande lordes de Epheotus relutantemente aceitaram — sua posição padrão era que o mundo era agora Epheotus, já que Epheotus agora fazia parte do mundo —, Virion, por sua vez, argumentou que, uma vez que essa era minha ideia, era claramente a correta. Não tinha certeza se concordava, mas os outros líderes mundiais tinham concordado, então…
Fiquei em silêncio enquanto os outros discutiam brincando, com a conversa acabando eventualmente quando Regis proclamou:
— Tudo o que ouço são muitos exemplos de nomes que não são tão bons quanto Regis-lândia.
Caímos naquele bate-papo tranquilo de família, e quase fiquei triste quando os freios do trem guincharam, cortando a conversa agradável e anunciando nossa chegada iminente.
— Nossa!
Enquanto Ellie exclamava, seguimos seu olhar pela janela. Havíamos chegado ao terminal sob Xyrus, que eventualmente seria uma estação central para todos os trens que cruzariam Dicathen. E embora isso fosse interessante, não foi o que chamou a atenção de Ellie.
Na plataforma de chegada — e ao redor dela, estendendo-se além do que se podia ver pela pequena janela — havia um mar de pessoas. O som de seus aplausos de repente se tornou alto o suficiente para ser ouvido sobre o ronco do trem.
Concentrei-me em rosto após rosto à medida que passavam, cada um exibindo um sorriso ou no meio de um grito extasiado. Elfos, anões e humanos apareciam por alguns segundos antes de sumirem novamente. Então distingui um panteão de três olhos e um basilisco com chifres. E um pequeno grupo vestido no estilo alacryano.
— O que todas essas pessoas estão fazendo aqui? — De repente, lembrei-me da multidão incomum na estrada.
— Acho que nossa chegada não foi tão secreta quanto você esperava — disse Virion, embora não parecesse descontente. — Olhe todas essas pessoas.
Todos ficaram congelados por um longo momento, não olhando para a multidão, mas para mim, com expressões interrogativas.
Com minha esperança de alcançar paz e tranquilidade de encontrar a academia vazia, antes de se acumular uma multidão, extinta, liderei o caminho através do trem em direção à saída mais próxima com um suspiro.
Regis caminhou ao meu lado enquanto eu hesitava, olhando para as portas do trem e ouvindo a cacofonia de sons lá fora.
— Quer que eu e Chul abramos caminho?
Através da memória enevoada, recordei meus anos de treinamento em minha vida passada e como regulava meu pequeno reservatório de ki antes de uma luta. Agora, após todo esse tempo, repeti aquele ritual, deixando-o me acalmar.
— Não, está tudo bem.
Levantando, desci até às portas, que se abriram exatamente quando cheguei a elas. A plataforma ficou em absoluto silêncio. Olhei ao redor para a multidão, tão barulhenta e animada apenas um instante atrás, agora todos encarando em total atenção. Eles enchiam a plataforma, o salão principal da estação, o mezanino do segundo andar ao redor do salão e os becos entre o salão principal e os prédios auxiliares que sustentavam a junção em construção. E, mais adiante, podia ver pessoas se estendendo pelo terreno de terra batida e ainda não desenvolvido.
Então, quase em uníssono, como se tivesse sido orquestrado, eles se curvaram.
Um nó se formou na base de minha garganta enquanto eu movia o olhar lentamente de um lado da multidão para o outro, ainda captando novos detalhes. Grupos de anões se misturavam com elfos, alacryanos com cidadãos de Sapin, e asuras estavam espalhados por todo lado. Três velhos estavam sentados num banco em frente ao edifício da estação, com a multidão se abrindo para lhes permitir ver, enquanto um grupo de crianças tinha subido em várias caixas empilhadas, dando-se cotoveladas a cada vez que uma cabeça começava a levantar-se de sua vênia.
Meu olhar fixou-se numa cabeça de cabelo castanho-acinzentado e uma barba por fazer, e o nó na minha garganta tornou-se quente e apertado. Não era meu pai, é claro. Tantos rostos na multidão eram familiares, mas nenhum deles era minha família.
Não, minha família agora estava atrás de mim, me apoiando como sempre fez.
Foi por eles que lutei desde criança neste mundo. Para mantê-los seguros, para permitir que fossem felizes. E foi minha família, tanto os presentes quanto os que perdemos, que esteve lá para me incentivar mesmo nos momentos mais sombrios. Quando as Lanças estavam contra mim, ou os reis e rainhas, ou Kezess e Agrona. Ou o próprio Destino. Minha família esteve ao meu lado apesar do perigo, sempre confiando em mim para liderá-los.
Ao olhar para a multidão curvada em silêncio, entretanto, parte da ansiedade e preocupação que sentia derreteu como a geada da primavera sob o sol da manhã.
Eles haviam se reunido aqui em dignidade, em paz, de todos os cantos do mundo. Agora, precisariam se apoiar mutuamente com a mesma coragem que minha família me apoiou, lutar uns pelos outros com a mesma determinação com que lutei pela minha família.
Considerei novamente o nome dos djinn para seu futuro idealizado. Para eles, todos estariam unidos em um mundo onde a paz compartilhada reinasse, não a autoridade individual ou o poder avassalador. Mesmo quando os dragões os atacaram, aqueles como Haneul nunca desistiram de criar o mundo que sabiam ser possível.
Ser coroado em paz. Um futuro idealizado onde o mais humilde camponês e o mais poderoso dragão pudessem coexistir sem medo ou desdém. Para os djinn, o éter era o denominador comum, um grande equalizador, mas em um mundo onde a paz realmente reinasse, seria o respeito que elevaria todos ao nível de iguais.
Avancei, meu coração pleno e meu espírito aquecido enquanto a multidão, o povo reunido deste novo mundo, erguia-se lentamente. Um murmúrio percorreu-os enquanto eu retribuía a reverência, mantendo-a pelo mesmo tempo que eles. Um símbolo de respeito compartilhado.
Nosso mundo não era perfeito. Talvez nunca fosse. Mas o nome do mundo seria como uma promessa de continuar tentando, de continuar avançando em direção àquele ideal.
Pax Coronata. Esse era o nome que os djinn esperavam que este mundo um dia se tornasse digno. E assim, era como o chamaríamos.
Não apenas uma promessa, mas um grito de guerra para lutar contra as piores fraquezas e falhas de nosso passado coletivo. Um chamado para continuarmos nos tornando melhores, mais fortes, uns para os outros.
Isso não é o fim, mas o começo.
Com isso conclui-se o capítulo final de “O Começo Depois do Fim”. A maioria de vocês já sabe disso, mas TBATE foi minha primeira série. Todas as noites após o trabalho, o mundo de TBATE tornava-se um refúgio para mim — um lugar para me perder e não pensar em mais nada. Explorei esse mundo ao lado dos personagens que criei e os acompanhei enquanto aprendiam e cresciam.
Nunca esperei que ficasse tão grande. Ainda me lembro de postar um capítulo assim que terminava de escrevê-lo, sem nem revisar, só para começar a ler os comentários das poucas dezenas de leitores que acompanhavam e esperavam por atualizações de TBATE. Não me sentia um escritor naquela época. O que eu escrevia parecia mais um playground para mim e meus leitores explorarmos juntos. Era uma comunidade que me dava força.
Agora… dez anos depois, aqui estamos. Vocês e eu crescemos tanto ao longo desses anos. Ainda me pego pensando naquelas noites em que respondia aos comentários após publicar um capítulo. Não importa o quão grande TBATE tenha se tornado, sempre volto àqueles momentos, porque foi isso que me fez começar, e foi isso que me manteve seguindo esse caminho. Então vou dizer novamente, porque é sincero todas as vezes. Obrigado. Sem todos vocês, eu nunca teria tido a confiança ou a disciplina para ser um autor. Ainda tenho muito espaço para crescer, e espero que vocês continuem aqui para crescer ao meu lado.