Lançamento junho 5, 2022
POV TESSIA ERALITH
— Eu posso lutar, vovô! — gritei, batendo as mãos na mesa.
— E estou lhe dizendo que você não pode. — retrucou quando seus olhos ficaram colados ao documento que estava lendo, recusando-se a encontrar o meu olhar.
— Chega, Tessia. Seu avô está certo. O risco de colocá-la em campo é muito alto e desnecessário no momento — mestre Aldir interrompeu.
— Mas mestre! Até você disse que estou muito mais forte do que era antes! — argumentei, ignorando meu avô.
— E isso ainda não é suficiente. — O tom do Asura de um olho era natural.
Pude sentir meu rosto queimando, enquanto fazia tudo o que podia para manter minhas lágrimas sob controle. Recusando-me a deixá-los me ver chorar, saí da sala, enquanto vovô me chamava.
Caminhei pelo longo e estreito corredor iluminado por tochas bem espaçadas que cintilavam intensamente contra a parede de paralelepípedos. Segui para o final do corredor, alcançando duas portas de ferro maciço, guardadas de ambos os lados por um aumentador de armadura e um conjurador bem vestido.
— Princesa? O que a traz aqui? — o conjurador falou, sua voz cheia de preocupação.
— Por favor, abra as portas. — pedi, meus olhos focados no centro da entrada. Apesar do meu humor azedo, não pude deixar de encarar com admiração as portas que guardavam este castelo. Lembrei-me de que, quando foi concluído pela primeira vez pelo professor Gideon, até o mestre Aldir ficou satisfeito com o trabalho manual.
— D-Desculpe, não recebemos nenhum aviso do comandante Virion ou lorde Aldir de que alguém iria embora. — o aumentador murmurou enquanto trocava olhares incertos com o companheiro.
— Abra as portas, ela tem algo a resolver comigo. — uma voz familiar ecoou detrás de mim.
— General Varay! — Ambos os guardas saudaram em uníssono antes de se curvarem em respeito.
Virando-me, soltei um sorriso aliviado para a lança, que se tornou uma irmã mais velha para mim nos últimos dois anos.
A lança elegante, mas intimidadora, se aproximou de mim com uma marcha firme e proposital, seu casaco azul marinho justo atrás dela. A mão esquerda de Varay repousava no punho da espada fina presa à cintura enquanto balançava a cabeça para mim, com sua expressão distante e habitual.
Os dois guardas imediatamente começaram a abrir as portas duplas. O conjurador murmurou um longo encantamento enquanto o aumentador trabalhava puxando os vários botões e alavancas por toda a porta.
— Obrigada, Varay. — Abracei seu braço enquanto nos dirigíamos para dentro da sala.
Uma vez lá dentro, as portas duplas de ferro se fecharam atrás de nós com um baque alto. Enquanto a sala estava fortemente protegida com um mecanismo único na porta que exigia um padrão complexo de feitiços e movimentos precisos de travas para abrir, a área que protegia não era tão digna de nota. A pequena sala de cilindros bastante mofada estava praticamente vazia, exceto por um único portão de teletransporte e um porteiro encarregado de controlar o destino do portão.
O porteiro idoso levantou-se diretamente à nossa vista, largando o livro que estava lendo para passar o tempo.
— General Varay, princesa Tessia, o que posso fazer por vocês?
Varay olhou por cima do ombro, esperando-me falar.
— Cidade Etistin, por favor. — respondi.
— Certamente! — O porteiro foi trabalhar, resmungando sobre as runas antigas que permitiam uma magia tão complexa.
O portão, uma plataforma de pedra com um símbolo complicado que marcava o centro, começou a brilhar em cores diferentes antes de focar na direção da localização.
— Tudo pronto. Pegue este emblema para identificação quando usar o portão em Etistin. Esta será a única maneira que o porteiro deixará você voltar ao castelo. — disse o porteiro idoso, enquanto entregava a nós duas um pequeno medalhão de metal com as insígnias das três raças.
— Certamente eles saberiam quem somos, certo? — Perguntei enquanto colocava o medalhão no bolso interno do meu roupão.
O porteiro balançou a cabeça.
— A segurança aumentou em todo o continente, porque ataques externos se tornaram mais frequentes. Apesar de Etistin ainda estar bem distante da Clareira das Bestas, o comandante Virion empregou medidas mais rigorosas para o caso.
— Entendo. — Soltei um suspiro quando me aproximei da plataforma onde ficava o portão de teletransporte.
— Você tem certeza que quer vir comigo para tomar conta de mim, Varay?
— Acabei de terminar minhas aulas com a princesa Kathyln, então um pouco de folga está bom. — respondeu bruscamente, dando um passo atrás de mim.
Nosso ambiente distorceu assim que entramos no portão, minha visão sendo preenchida com uma montagem embaçada de cores luminescentes.
Chegamos em segundos à cidade que já foi a capital dos humanos no país de Sapin. Lembrei das aulas da academia que a cidade foi construída sobre a costa oeste do continente naquela época para ficar fora de alcance dos países anões e élficos, bem como para se manter o mais longe da Clareira das Bestas quanto possível.
No entanto, alguns anos atrás, depois que a guerra foi anunciada, o rei Glayder basicamente derrubou a cidade, assim como todas as cidades vizinhas, e as reconstruiu como fortes blindados. Isso era uma antecipação do exército de Alacrya provavelmente vindo para este lado.
— Princesa Tessia e General Varay! — exclamou os dois homens surpresos, enquanto se curvavam profundamente.
— Nós não estamos aqui em negócios oficiais. Por favor, relaxe. — persuadi, sorrindo para os guardas que tinham expressões preocupadas. Saímos da sala segura onde o portão foi colocado, saindo pelas ruas movimentadas. Nós duas escondemos o rosto debaixo de nossos capuzes de lã para não atrair atenção desnecessária.
Lá fora, as ruas estavam cheias de um panorama de agitação e barulho. Os comerciantes rodavam com seus carrinhos pela rua larga, enquanto os vendedores e artistas que haviam montado pequenas tendas e coberturas em ambos os lados da estrada principal estavam discutindo com as donas de casa. Desde que Etistin foi demolida e reconstruída como uma cidade militar, a economia dependia dos soldados e de suas famílias que estavam estacionadas aqui. Ferreiros e outros artesãos viajaram para cá sabendo que seu trabalho estaria em alta demanda. Os comerciantes logo se esforçaram para montar lojas aqui, por causa da crescente população que variava de quantos soldados estavam estacionados.
Apenas andando pela rua, você podia ver os soldados, quer fossem aumentadores corpulentos ou conjuradores, marchando com armas na mão. Todos usavam o mesmo uniforme verde musgo e prata com o emblema Triunion que se tornara o símbolo oficial de Dicathen.
— Há algo específico que você quer fazer?
Varay perguntou enquanto diminuía o ritmo para combinar com o meu.
— Nada particularmente. — balancei minha cabeça. — Eu só queria um pouco de ar fresco e ficar longe de todos no castelo.
— Mantenha sua espada sempre pronta, Tessia. — disse Varay, apontando para minha cintura vazia.
Soltando um suspiro, respondi:
— Estou aqui com você, certo? Além disso, esta cidade é o ponto mais distante de todos os combates.
Etistin foi reconstruída para ser a última linha de defesa contra o exército Alacryano, visto que era a cidade mais distante das batalhas e a sua localização era a ideal, com a maioria dos lados voltados para o oceano.
Nossas principais forças foram realmente enviadas para a Clareira das Bestas para explorar masmorras, porque era dali que as forças Alacryanas estavam saindo. Pelo que o vovô Virion deduziu de suas investigações, as ocorrências não naturais que aconteceram no passar dos dez anos, incluindo a morte de uma de nossas lanças, Alea, tinham o objetivo de montar portões de teletransporte ocultos nas profundezas das masmorras. Seria difícil para eles, teletransportar instantaneamente um exército, mas com tempo suficiente e portões individuais de teletransporte, as forças de Alacrya poderiam reunir soldados e magos suficientes para causar danos consideráveis se não se preparassem antes.
Depois que essa notícia veio à tona, o mestre Aldir e meu avô tiveram que fazer estratégias sobre as defesas em torno da Clareira das Bestas.
— Em tempos de guerra, é necessário estar sempre pronta para o pior caso. — respondeu Varay.
Eu não queria discutir mais, então tirei minha espada do meu anel de dimensão e amarrei-a na cintura por baixo da capa de lã.
— Feliz?
Ela assentiu. — Satisfeita.
— Então, como está Kathyln e Curtis com seu treinamento?
Perguntei calmamente, parando em uma barraca que tinha um conjunto particularmente bonito de joias artesanais.
— Bairon me diz que Curtis é determinado e trabalhador, mas que o progresso dele é lento. Definitivamente fez progressos, mas mesmo como domador de bestas, sua compreensão de mana é apenas mediana na melhor das hipóteses. A princesa Kathyln, por outro lado, está se saindo bem em seu treinamento. Foi-me dito que ela era sempre um pouco mais talentosa do que todos os outros, e a partir desses dois anos, entendo o porquê. — Varay respondeu, olhando de maneira apática para as joias de que não gostava.
— Bem, não mais do que todos os outros. — corrigi quando uma dor maçante tomou conta do meu coração.
— Você está certa. Às vezes esqueço que o garoto tem a idade de vocês. Arthur é uma anomalia de um nível totalmente diferente, sem dúvida. — Varay assentiu para si mesma. — Só posso imaginar em que nível ele estará quando voltar depois de treinar com os Asuras.
Mesmo através de seu rosto inexpressivo, era fácil dizer que Varay estava com um pouco de inveja de Arthur. Afinal, treinar com os Asuras em um nível mais alto que o nível do próprio Mestre Aldir, era algo que alguém só poderia desejar em seus sonhos.
No entanto, sabia em primeira mão o quão severos eram os Asuras das dezenas de lições que recebi de Aldir nos últimos dois anos. Imaginar-me sob constante supervisão do Mestre Aldir enviou arrepios na minha espinha.
Enquanto continuávamos andando pela estrada principal, admirava as imponentes muralhas externas que cercavam a cidade inteira. Mal podia ver as pequenas figuras de guardas patrulhando em cima do muro de onde eu estava. A cidade foi reconstruída para que os edifícios no centro da cidade fossem mais altos. Os prédios e as casas ao redor de tudo isso eram menores, de modo que conjuradores e aumentadores de longo alcance pudessem facilmente subir no topo de qualquer um dos edifícios e ter uma visão clara de seus inimigos, atacando sem medo de obstrução. Claro, isso seria somente se os inimigos fossem capazes de invadir as grossas paredes forçadas de mana que cercavam Etistin.
— Você acha que o exército Alacryano será capaz de chegar até aqui? — perguntei, ainda encarando as paredes externas. — Ouvi do vovô que a diretora Cynthia disse que Alacrya está a oeste de Dicathen. Isso não significa que este lugar é o mais próximo do nosso inimigo?
— Sim, mas ela também disse que eles não tinham uma maneira eficaz de transportar quantidades significativas de soldados através do oceano, e é por isso que eles estão indo por um método mais discreto de passar pelos portões de teletransporte que haviam instalado por toda a Clareira das bestas. — respondeu enquanto se afastava para ver algumas das armas em exibição em uma forja próxima.
— Entendo. — murmurei. Me senti mal pela diretora Cynthia, que estava confinada por esses dois anos. Enquanto o mestre Aldir foi capaz de quebrar o suficiente da maldição que a impedia de divulgar qualquer informação sobre sua terra natal, para que pudesse nos contar alguma informação, a diretora Cynthia ainda acabou em estado de coma. Às custas de sua consciência, a mulher que já foi responsável pela Academia Xyrus pôde nos dizer algumas informações críticas sobre sua terra natal. Agora, estava simplesmente deitada, mal viva, em uma sala constantemente cuidada por uma enfermeira.
Muitos dos negócios relacionados à guerra causaram uma tensão no meu relacionamento com meu avô. Enquanto sempre parecia assustador, vovô sempre foi o homem legal e embaraçoso que só queria o melhor para mim. Depois que assumiu o papel de comandar as forças militares com o mestre Aldir, que operava apenas nas sombras, sua personalidade se tornou mais sombria e mais rigorosa.
Eu odiava que isso acontecesse, mas não culpei o vovô; pelo menos eu era capaz de vê-lo com mais frequência do que minha mãe e meu pai. Meus pais e os pais de Kathyln estavam trabalhando na frente social, fazendo todo o possível para fortalecer e implementar ações nas cidades. Com o rei e a rainha Greysunders mortos, os anões estavam em rebelião, então nossos pais estavam trabalhando para, mais uma vez, obter sua lealdade.
— Cuidado! — Alguém de repente gritou quando correu de cabeça para mim.
Com meus pensamentos totalmente ocupados em outro lugar, meu corpo correu por instinto quando eu agarrei seu pulso enquanto eu girava meu corpo. Colocando meu pé na frente dele, a pessoa tropeçou e eu o prendi com a espada sem desembainhar, pressionada contra a garganta, quando vi o rosto da pessoa.
— Emily? — disse, alarmada.